sábado, 10 de novembro de 2018

No dia em que ocê foi embora.

No dia em que ocê foi embora
Eu fiquei sozinho olhando o sol morrer

E fiquei. E até o sol queria se despedir de mim. Porque é lógico que queria, todo mundo quer. Não parecia mais um até logo, vou voltar amanhã. Soava mais como um adeus, entenda-se com a noite. E fiquei.
Sozinho, especialmente. Naquele mar não havia espaço que coubesse a dimensão do meu estar sozinho. Por quilômetros e quilômetros, não se encontraria uma só vivalma para me fazer pagar esta língua. Mas, pensei, melhor que assim seja. Melhor que assim seja pois naquele mar não há água salgada o suficiente para se equiparar ao meu choro. E antes chorar pro vazio. Antes chorar pra mim.
E fiquei.
O que se podia fazer? Além de encarar aquelas pedras cinza-chumbo salgadas, e ficar em silêncio? Além de agarrar o peito e não gritar por socorro, pois era eu mesmo que me apertava as cordas que desfaziam minha pele. Era eu? Ou era você?
Éramos nós.
Já éramos.
E fiquei. Não fiz mais do que ficar.

No dia em que ocê foi embora
Eu fiquei sentindo saudades do que não foi
Lembrando até do que eu não vivi
Pensando em nós dois

O futuro, refleti, se possível me deixava mais saudades do que o passado. E era possível. E é. Aquela vez em que – não – fomos a Curitiba. Aquela vez em que – não – saímos para comer pastel. Quando – quase – fomos felizes juntos.
E o que esperar agora? Que sejamos felizes desjuntos? Não sei se caio nessa. E você? Gostaria de olhar nos seus olhos e te perguntar o que você pretende fazer agora. Como você pretende se desprender de mim, e se você pode me ensinar como fazer.
Talvez – e você sabe que isso é tudo o que sempre fomos – isso seja só uma desculpa pra olhar nos seus olhos.
E apertou. Apertou forte. Me senti parafusado naquela pedra, não havia vendaval que me movesse. Apertou assim.
E me perguntei. Desculpe, eu me perguntei. Me perguntei se apertou em você também. O que há de pior em mim quis dizer que espera que sim, que espera que você também tenha sentido ao menos metade desse sufoco. 
Então matei o que há de pior em mim. Espero que você tenha ido leve. Espero que você tenha levado só seus chapéus e o caderno que eu te dei. Espero que tenha deixado o aperto pra trás. Te juro, te juro que espero. E você sabe: eu juro forte.

Pois no dia em que ocê foi embora
Eu fiquei sozinho no mundo, sem ter ninguém
O último homem no dia em que o sol morreu

E fiquei. E juntei os joelhos no peito, porque esfriava. E ignorei o quanto o sol parecia bonito enquanto morria. Era insuportavelmente bonito, e eu queria que nada nunca mais fosse. Se você não estaria ali pra ver, as coisas não precisavam mais se preocupar com beleza.
O mundo foi feito para ser visto pelos seus olhos, e se você não estivesse por perto... talvez não houvesse mundo.
O que me restara?
Com sorte, você teria deixado um rabisco ou outro pra trás em algum dos meus muitos cadernos, algumas mensagens que eu esqueci de apagar, seu cheiro em alguma almofada. Mas não sei mais se tenho sorte. Talvez você tenha arrancado todas as páginas, deletado todas as palavras e lavado todas as almofadas. E deixado pra trás apenas isto: algo para me assombrar. Uma lembrança? Um sentimento? Um truque de luz, ilusão de óptica?
Um fantasma?
E você assombra. Todos os dias. E eu deixo. Eu deixo, está bem? Puxe meus pés, me sacuda até acordar de madrugada suando frio, grite nos meus sonhos, sente nas poltronas da minha mente e nunca mais,
Nunca mais levante.
Mas não se vá.
Eu sei que já se foi.
Mas se vá menos.
Vá só de corpo, se precisar ir.
Vá só de voz, se precisar ir.
Mas deixa eu te guardar na cabeça. É um lugar estranho, mas é todo seu. Deixa eu te guardar na parte mais bonita da minha mente. Tudo ali você que fez.
Fique.
E fiquei.
E estou aqui.

2 comentários:

  1. Espero que o poeta seja mesmo um finjidor, pois ninguem merece sofrer tanto

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Esta poeta gosta de usar as palavras para dizer a verdade, ainda que às vezes ela seja um tanto sofrida..!

      Excluir